Introdução
A
cidade do Rio de Janeiro vive um ressurgir do tradicional carnaval de rua. Ao
som das clássicas marchinhas ou levados por novos acordes, os foliões se
espalham por toda cidade do Rio em jornadas festivas que começam às sete horas
da manha e adentram as madrugadas. Em dez anos o carnaval de rua se transformou
de um acontecimento local, centralizado em alguns bairros da cidade, em um
fenômeno urbano que atrai pessoas de todo o Brasil. Em matéria publicada no
jornal O globo, a prefeitura da cidade do Rio de Janeiro divulgou que no ano de
dois mil e treze, o carnaval de rua
da capital fluminense movimentou mais de 5,3 milhões de foliões.
Nesse
sentido o presente texto busca demonstrar de forma clara e objetiva a parceria
publico privado estabelecida entre a prefeitura da cidade do Rio de Janeiro e a
empresa de realização de eventos Dream Factory, responsável pelo planejamento,
organização e gestão do carnaval de rua da cidade maravilhosa. Procura-se
levantar questões pontuais sobre os desdobramentos econômicos e sociais da
iniciativa.
Formalização da
parceria
A
parceria é formalizada por instrumento contratual devidamente publicado no
Diário Oficial do Município do Rio de Janeiro. O citado contrato realiza-se de
forma consecutiva desde sua primeira implantação no ano de 2009, através da
Riotur – Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro S/A e a Dream
Factory-Comunicação e Eventos Ltda, com a interveniênciada Companhia de Bebidas
das Américas-AMBEV e da ITAÚSA- Investimentos Itaú S/A. A citada empresa é
responsável por elaborar e implantar um projeto que abarque o calendário oficial
da temporada de carnaval de rua da cidade. Assim sendo, cabe à empresa organizar
toda a infraestrutura necessária à realização do evento, assim como negociar
junto às principais ligas de blocos os horários e percursos a serem realizados
pelos participantes.
Essa
iniciativa publica privado, estabelece normas e regras a serem cumpridas de
modo que “transformou o carnaval de rua da cidade em produto turístico
organizado, um evento que é bom tanto para os foliões quanto para quem não
brinca o carnaval e, também, uma propriedade valiosa para as marcas” (http://doweb.rio.rj.gov.br/ler_pdf.php?edi_id=1978&page=73).
A
partir desse panorama geral, foi realizada investigação para levantar dados em
vista a responder questões referentes à articulação existente entre as esferas
publico privado e apontar desdobramentos socioculturais dessa iniciativa. Nessa
perspectiva, verificar a ação do capital privado no espaço urbano e sua influencia
no fenômeno de revalorização do carnaval de rua na sociedade carioca - sua
aparente espontaneidade frente aos incentivos do marketing empresarial. A criação de nichos econômicos exclusivos
para as empresas patrocinadoras do evento. Assim como gerar base cartográfica sobre
a espacialização do fenômeno na cidade. Em suma, a transformação de um
acontecimento sociocultural em um recurso econômico a ser efetivamente
explorado.
De foliões a consumidores – marketing empresarial nos blocos de rua
Conforme nota publicada no Diário Oficial do
Município do Rio de Janeiro, no dia vinte de agosto de 2012 (doc. em anexo), a
empresa de eventos Dream Factory, firmou contrato para organização do carnaval
de rua 2013 da cidade do Rio de Janeiro. Segundo nota publicada no Diário
Oficial do município do Rio de Janeiro no dia onze de outubro de 2012, o
presente instrumento foi assinado sem a ocorrência de processo licitatório
devido à falta de concorrência - única proponente do projeto foi a citada
empresa. Assim sendo, pelo quarto ano consecutivo o carnaval de rua da cidade do
Rio de Janeiro, esteve sob os cuidados da Dream Factory. Ao verificar os
valores, se constata: não oneroso. Em outras palavras, a empresa arcou com os
custos totais da montagem da infraestrutura do evento, sem aportes de parte da
prefeitura. Isso foi possível devido à interveniência das empresas AMBEV e
ITAUSA, que junto à Dream Factory e a outros patrocinadores menores, somaram um
valor de investimento total de 20 (vinte) milhões de reais (http://www.valor.com.br/brasil/2545146/carnaval-gera-us-850-milhoes-para-o-rio-de-janeiro).
Não
foram encontrados dados suficientes que permitissem descriminar os valores
lucrados por essas empresas durante o evento. Segundo a Agência Brasil de
comunicação em nota publicada no dia 18 de fevereiro de 2013:
“O carnaval de rua da capital fluminense movimentou este ano mais de 5,3
milhões de foliões, de acordo com balanço divulgado hoje (18) pela prefeitura
carioca. O resultado significou um aumento de 0,19% em relação à festa do ano
passado. Do dia 19 de janeiro até o dia 20 de fevereiro, 1, 212 milhão de
visitantes estiveram na cidade, gerando uma renda de cerca de R$ 848 milhões” (http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-02-18/numero-de-folioes-aumentou-no-carnaval-de-rua-do-rio-este-ano).
Esse montante de números e valores exige empresas de
alto poder de ação e influencia no setor publico. A frente da empresa Dream
Factory, encontra-se Roberta Medina (Presidente da Empresa) filha do influente
publicitário Roberto Medina. Com dez anos no mercado de mega eventos a empresa
já organizou o Rock in Rio em suas versões no Rio de Janeiro, Portugal e
Espanha; Maratona da Caixa Econômica - Rio de Janeiro, produção da árvore da
Lagoa Rodrigo de Freitas na zona sul carioca; está a cargo da jornada da
juventude cristã que ocorrera no rio de Janeiro, dentre outras realizações. Dado
relevante dessa parceria publica privado estabelecido entre a empresa Dream
Factory e o partido político PMDB-RJ verifica-se na constatação de que a
empresa aumentou vertiginosamente sua atuação no espaço publico carioca a
partir do primeiro mandato de Eduardo Paes à prefeitura da cidade do Rio de
Janeiro em 2009.
Em matéria publicada na pagina oficial do vereador
Eliomar Coelho do partido político PSOL-RJ, lese:
“O
mandato Eliomar Coelho descobriu que a empresa (Dream Factory) doou R$ 347 mil
à campanha de Eduardo Paes nas eleições do ano passado. Eliomar pedirá, ao
Tribunal de Contas do Município, uma inspeção extraordinária nos contratos
firmados pela prefeitura para a realização da festa momesca na cidade” (http://www.eliomar.com.br/por-que-a-ambev/).
Encontra-se publicado no blog do ex-prefeito Antony
Garotinho:
“Dream
Factory ganha tudo sem licitação. É a decoração de carnaval, a produção dos
blocos, agora Jornada Mundial da Juventude, uma atrás da outra. E não custa
lembrar que corre na Justiça a Ação Popular contra Cabral por ter dado à Dream
Factory R$ 5,8 milhões, em 2010, a pretexto de patrocinar, pasmem, o Rock in
Rio que foi realizado em Lisboa, Portugal. A ação pede que Cabral devolva aos
cofres públicos essa fortuna” (http://www.blogdogarotinho.com.br/lartigo.aspx?id=9985).
Espacialização e território
empresarial do fenômeno urbano
O
projeto para o carnaval de 2013 denominou-se - Carnaval do Rio: cada vez
melhor. A organização administrou os 492 blocos de rua cadastrados na Riotur
que desfilaram por sete regiões da cidade, a saber: 148 (zona sul); 47 (Barra);
37 (Zona Oeste); 25 (Ilha do Governador); 87 (Centro da Cidade); 91 (Zona
Norte) e 57 (Grande Tijuca), durante os dias de dezenove de janeiro à vinte de
fevereiro - dias do calendário oficial do carnaval de rua. A infraestrutura
contou com a organização de transito nas ruas da cidade com controladores de
trafego (1.200 diárias no total), 16.200 diárias de banheiros químicos
espalhados por diversos pontos, cuidados médicos com 80 diárias de UTI móvel,
produção e publicação com diferentes formatos, alem do cadastro dos vendedores
ambulantes.
Verifica-se
um aumento vertiginoso não apenas no numero de blocos e foliões, mas sim no
controle desses blocos de parte da empresa organizadora do evento. Em
entrevista à Revista Época Negócios, Duda Magalhães – diretor geral da empresa
Dream Factory, aclara:
“em 2011, a empresa organizou 170 dos 460
eventos registrados pela prefeitura. Com o aumento de participantes nos blocos
menores, no ano passado, esse número pulou para 350, de 476 registrados. De
acordo com a Riotur, 583 blocos já estão registrados para 2013, um aumento de
22,48%” (http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Acao/noticia/2012/11/carnaval-de-rua-do-rio-cresce-e-tem-nova-cota-de-patrocinio-de-r-3-mi.html).
Essa
informação é corroborada ao verificar que o numero de quinhentos e oitenta três
blocos de rua registrados na Riotur, um total de quatrocentos e noventa e dois
blocos foram cadastrados na empresa organizadora – somando 85% do total de
blocos supervisionados diretamente pela Dream Factory.
A outra cara do carnaval de rua
Esse
cadastro não atende apenas aos que se destinam a desfilar, brincar e pular o
carnaval de rua. Abarca em igual instancia aqueles que pretendem trabalhar
durante a realização do evento. Conforme esquema montado em conjunto à
prefeitura, os vendedores ambulantes são devidamente cadastrados e, apenas
trabalham no evento, os indivíduos com a credencial oficial da empresa Dream
Factory. Esse procedimento ocorre na vila olímpica no bairro da Saúde e,
conforme diversas reportagens divulgadas durante o período do carnaval 2013
ocorreram atos de insatisfação de parte dos trabalhadores ambulantes em face da
organização do credenciamento. Segundo depoimentos houve negligencia no
tratamento do pessoal que aguardava na fila do credenciamento:
“O ambulante Darci Ramos Neto, que vende diariamente
refrigerantes, disse que ficou um dia e meio na fila e não conseguiu a
credencial. “Já perdi dinheiro por causa da fila”. Muita gente atrás de mim
conseguiu a licença, e eu não. Vi os próprios seguranças vendendo a senha por
R$ 30 e duas caixas de isopor do kit por R$ 150” (http://www.jb.com.br/rio/noticias/2013/01/24/prefeitura-nao-libera-novas-licencas-para-ambulantes-no-carnaval/).
Essa
situação se agravou e repercutiu em forma de manifestação realizada pelos
ambulantes a sede da prefeitura na cidade nova.
“Terminou sem acordo a reunião entre o secretário de turismo e presidente da
Riotur, Antônio Pedro, e representantes dos candidatos a ambulantes no Carnaval
2013. A Prefeitura não liberou novas licenças, como reivindicavam as centenas
de pessoas que fizeram uma manifestação nesta quinta-feira na Cidade Nova” (http://www.jb.com.br/rio/noticias/2013/01/24/prefeitura-nao-libera-novas-licencas-para-ambulantes-no-carnaval).
Território Empresarial
A
empresa de bebidas AMBEV patrocinadora oficial e interveniente do contrato de
realização do carnaval de rua da cidade do Rio de Janeiro possui exclusividade
de venda de seus produtos nos blocos cadastrados pela empresa Dream Factory.
Assim sendo a empresa controla 85% do mercado, representado pelos foliões-consumidores.
Esse fato cria aos participantes do evento a imposição de consumo de uma
determinada marca de bebidas.
Os
recortes de reportagens abaixo citados, demonstram de forma clara a forte
disputa existente entre as empresas.
Conforme Alex Costa, secretário de ordem publica do Rio:
“Quem ganhou a exclusividade é a Ambev,
então as mercadorias de outras cervejarias que veicularem propagandas sem
autorização da prefeitura terão o material retirado, confiscado, e as empresas
serão multadas — disse Costa. Segundo ele, a multa pela ação de marketing
indevida ainda não foi definida” (http://oglobo.globo.com/blocos-de-carnaval/ambev-prefeitura-acusam-devassa-itaipava-de-marketing-oportunista-7563406).
Para um executivo do setor,
entrevistado pelo Jornal O Globo:
“Apesar da Riotur afirmar que vender outras marcas não é
proibido, desde que a venda não seja acompanhada de um marketing agressivo, o
fato é que conseguir cadastrar ambulantes para vender sua marca nos blocos não
é facilitada pela prefeitura”.(http://oglobo.globo.com/blocos-de-carnaval/ambev-prefeitura-acusam-devassa-itaipava-de-marketing-oportunista-7563406)
A matéria conclui:
“Nos últimos anos, o carnaval de rua do Rio virou um
negócio tão ou mais importante do que os desfiles do Sambódromo, tanto que a
prefeitura pensa em ampliar as cotas de patrocínio da festa. Segundo reportagem
na revista “Época Negócios”, a Dream Factory, empresa contratada para organizar
o carnaval de rua, está conversando com uma terceira empresa, além de Itaú e
Ambev, para vender nova cota, de R$ 3 milhões” (http://oglobo.globo.com/blocos-de-carnaval/ambev-prefeitura-acusam-devassa-itaipava-de-marketing-oportunista-7563406).
Conclusão
Frente
ao panorama apresentado
no ressurgir e revalorização do carnaval de
rua na sociedade carioca a partir de sua espontaneidade social ou do impulso
determinado pela lógica empresarial fortemente vinculada aos incentivos do marketing. Sob essa nova lógica as ligas
dos blocos de rua se vem submetidas a negociar e se adequar as normativas
estabelecidas e direcionadas pela lógica empresarial.
Verifica-se
a partir dos dados apresentados e da lógica empresarial que direciona os sujeitos
tomadores de decisão, o potencial de controle e ação das iniciativas da
parceria publico privado estabelecido entre a Prefeitura da cidade do Rio de
Janeiro, através de seu prefeito Eduardo Paes – PMDB e a empresa Dream Factory,
sob direção de Roberta Medina membro de influente família da sociedade carioca.
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